quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Tropa de Elite: um choque de ousadia



Enfim, a ousadia voltou a uma grande produção do cinema nacional, atraindo o público às salas de exibição e provando que a criatividade pode ser viável comercialmente. Em um tempo em que o cinema brasileiro, para se firmar como indústria, adotou sem pudor as fórmulas da TV - dando aos filmes o aspecto de novelas ou minisséries – Tropa de Elite quebrou padrões e se prepara para alcançar a merecida colocação de principal “arrasa quarteirões” de 2007.

O filme, do cineasta José Padilha, já desbancou o açucarado “Primo Basílio” (790 mil expectadores), do diretor de telenovelas Daniel Filho, e caminha para superar o campeão de bilheteria “A Grande Família – o filme” (2,2 milhões em público), adaptação para o cinema da série televisiva. Em Tropa de Elite, a linguagem remete mais ao documentário que à obviedade dos padrões da TV, pela crueza e realismo com que mostra as relações entre a polícia e o narcotráfico no Rio de Janeiro.

Nesse aspecto, o filme difere também do ótimo “Cidade de Deus”, que recorreu mais à uma estética inovadora, e menos ao relato cru, para mostrar como surgiu o crime organizado na favela carioca que dá nome ao filme, tornando-se a película nacional mais vista de 2002.

Em Tropa de Elite, não há os estereótipos de mocinhos ou vilões. Wagner Moura, em grande interpretação, dá vida ao personagem central, capitão Nascimento, comandante do Bope, a tropa de elite da PM a quem cabe repreender e desarmar o crime organizado. Com o peso do cargo e o orgulho de chefiar uma tropa que não sucumbe à corrupção policial, ele se sente à vontade para praticar tortura durante os interrogatórios, em busca de resultados. Também conduz com mãos de ferro o treinamento de uma nova turma para o Bope. Ancioso por se livrar do estresse que massacra sua vida pessoal, é entre os membros dessa nova turma que o capitão escolherá seu substituto para o comando da tropa.

Se capitão Nascimento tem qualidades e defeitos, todos no filme também têm. Inclusive a classe média politizada, retratada por universitários que sobem o morro para atuar em projetos sociais, mas que consomem seus baseados para relaxar, financiando o tráfico. Mesmo os traficantes não são mostrados sob o clichê de vilões, mas como uma força oposta à polícia em uma guerra não declarada.

Em pelo menos um sentido, Tropa de Elite é um marco. Foi o primeiro filme nacional que vazou pela internet e que chegou aos camelôs antes de seu lançamento oficial, alcançando grande público e se tornando o filme mais comentado do ano. Segundo o Ibope, mais de 11 milhões de pessoas o assistiram em cópia pirata. E mais de 1 milhão já foram ao cinema.

Seguindo na contramão das convenções, agora são as TVs que querem se apropriar do formato de Tropa de Elite, para transformar a história em seriado, assim como aconteceu com Cidade de Deus. Especula-se que Record, Globo, SBT e HBO estejam interessadas no projeto. É um pouco de criatividade chegando, por via única, ao cinema e à televisão. Os expectadores agradecem.

Novembro de 2007
Publicado no
www.jornaldotocantins.com.br

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