quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Cinco pessoas - crônica



É noite. Ela está em seu microcosmo de 6 metros de frente por 12 de fundo. Sente que sua própria vida também é assim: mínima em dimensão. Além de miúda, é uma vida que está em permanente estado de ameaça, por um buraco no peito que cresce a cada dia e por um estrangulamento iminente. Aquela mão imaginária que aperta sua garganta se torna mais firme. Hoje, dá espaço apenas para a passagem de um fiozinho de ar. Amanhã, certamente nem mais a isto.

Sua vida sempre seguiu um caminho reto e plano, mas não necessariamente de chão firme. É uma vida sem grandes desvios de percurso, sem estradas ensolaradas, becos escuros ou ladeiras que proporcionem descidas vertiginosas e subidas desafiantes. Poderia ser comparada a uma rua monótona, meio nublada, com poucos – e distantes – transeuntes. Grande parte deles igualmente frustrados, o que nunca lhe serviu de consolo nem desperta nela o desejo de compartilhar as angústias em comum.

Se na vida sempre foram poucas as ações contundentes, na sua mente houveram planos e ideologias avançadas. Mas isto foi já há algum tempo. Com o passar dos anos, seus ideais arrefeceram e seus planos de futuro passaram a parecer tão sem sentido quanto o próprio presente. E, sei lá, talvez já não nem hajam mais os tais planos e as tais ideologias.

A vida em seu interior, que um dia fora tão mais colorida que o universo que a cercava, hoje compartilha os mesmos tons acinzentados. Aquela sensação que teve um dia, de que tudo era início, que as portas estavam se abrindo e o horizonte era um campo a se correr enchendo os pulmões de ar, hoje se faz distante e equivocada. Era uma sensação que refletia apenas um momento, mas só agora ela sabe disto.

Entre seus semelhantes, três têm ligação mais direta com ela e parecem viver dias de maior intensidade, ou apenas se agarram a esperança de que seus dias seja assim. Uns transformavam os dias em noite, à procura da alegria furtiva do álcool, dos amigos comprados a preço de gasolina e do calor momentâneo de um e de outro abraço; outros enxergavam nas esposas, nos filhos e nos negócios a possibilidade de um conforto e uma estabilidade emocional que nunca alcançaram, e certamente nunca alcançarão.

Entre ela e estes três semelhantes existe a figura de um homem - pleno de dignidade, provedor, mas um pouco envelhecido e sem perspectivas ou esperanças, como todos eles. Não formam um grupo de pessoas más, pelo contrário. Mas cada um vivencia sua porção de amargura. Todos têm medo da solidão, consciência da finitude e da própria pequenez, e por isto têm a segurança de que, nos momentos de agonia, poderão se agarrar mutuamente, como aquele que se afoga recorre à tabua de salvação.

Estão todos distantes, unidos pela figura daquele homem mais velho, por suas angústias e por uma história em comum que se torna mais remota a cada dia.

Cada um deles tem consciência que conduz a própria vida ao vazio, embora nunca tenham conversado sobre isto. Estão juntos, no caminhar a esmo de hoje e no previsível vácuo de amanhã.

Publicado no www.jornaldotocantins.com.br

Nenhum comentário:

Postar um comentário