quarta-feira, 11 de março de 2009

Faltou sensibilidade à igreja



Mais uma vez, a igreja católica errou, colocando seus dogmas acima dos valores da piedade, compaixão e solidariedade. Errou sim, expondo seus ranços e indo na contramão de valores que estão na base do próprio cristianismo. Agiu de forma tão intolerante, perseguidora e ilógica quanto nos tempos da inquisição.

Poucos imaginariam que a igreja excomungaria uma mulher por ela permitir que a filha, de nove anos de idade, abortasse fetos gêmeos gerados a partir do abuso sexual praticado pelo padrasto. Pior, achando isso pouco, que a igreja estenderia a excomunhão também à equipe médica que livrou a menina de uma gravidez de alto risco. E, como a cereja que ornamenta o topo desse bolo de insensibilidade, poucos imaginariam que, excomungando mãe e médicos, a igreja livraria o padrasto da mesma penalidade, hierarquizando que o pecado de anos submetendo uma criança a torturas sexuais é inferior ao pecado do aborto.

Critico a igreja não por julgar que a excomunhão faça alguma diferença na vida da mãe da garota e dos médicos. Afinal, levada agora, junto à filha, para um abrigo público e sabendo dos anos de abusos praticados dentro de sua própria casa, essa mulher tem dramas psicológicos e sociais mais graves para ocupar seu tempo. O mesmo vale para a equipe médica que, ciente de seu papel, já afirmou que faria tudo de novo, independente da reprovação católica. Critico a igreja por, ao invés de estender a mão à vítima, condená-la com sua penalidade mais extrema – ou seja, a expulsão da vivência religiosa.

Neste episódio, a igreja católica importou-se apenas em reafirmar seus princípios seculares. Importou-se apenas consigo mesma, enquanto instituição, ignorando alguém quem sofre, ignorando alguém a quem deveria servir.

Faltou à igreja sensibilidade para equilibrar o peso entre defesa de seus dogmas e os dramas pessoais envolvidos na estória, incluindo o rico de morte da menina ou o nascimento de crianças geradas num estupro. A igreja poderia ter procurado a família da criança para oferecer ajuda, poderia ter se abstido de comentar o caso, poderia até ter reprovado publicamente o ato do aborto, mas optou pelo rigor da excomunhão. Em lembrança à Oração de São Francisco de Assis, faltou à igreja consolar, compreender, perdoar, amar e dar sem pensar em receber.

E não venham dizer que a excomunhão foi um ato impensado arcebispo de Olinda e Recife, circunscrição onde ocorreu o episódio. O fato ecoou no Vaticano e lá recebeu apoio da cúpula católica, sob o argumento de que, apesar da interrupção da gravidez ser legal, os gêmeos teriam direito à vida.

Na repercussão do caso, predominou entre a opinião pública a reprovação ao ato da igreja. Ou seja, os dogmas católicos, e não somente relativos ao aborto, mas outros, como a condenação ao uso da camisinha, estão isolados da realidade social. A igreja prega na escuridão, defendendo conceitos que não são seguidos por seus fiéis nem mesmo parte considerável do clero, na surdina das casas paroquiais, dos mosteiros e conventos.

Um comentário:

  1. É bem verdade que um erro não justifica o abuso dos representantes da igreja católica em excomungar certas pessoas por terem praticado o aborto, todavia, o que também é injustificável é o fato de médicos com consentimento de familiares terem praticado um dos crimes mais abomináveis que é o aborto, uma vez que a vitima esta totalmente indefesa.
    A justificativa de que a jovem corria perigo de vida, isso não justifica o ato de covardia e brutalidade, uma vez que existe vários fatos relatados nos anais médicos que comprovam o sucesso de partos dessa natureza.
    Sejamos lógicos, qual é o medico que pode fazer uma intervenção para um aborto e garantir a vida da gestante.
    Um forte abraço para você Flávio Herculano

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